Acompanhe esta saga através do tempo, da pré-história desse aparelho mágico à era da internet.
Milhões de almas salvas por três letrinhas
É longa a história da comunicação sem fios. A contribuição científica vem de longe. Em 1863, o físico inglês James Maxwell demonstrou teoricamente a existência das ondas eletromagnéticas. Em 1887, o alemão Henrich Hertz descobriu o princípio da propagação radiofônica. Todo o conhecimento acumulado por mais de meio século de experiências resultou na tecnologia aplicada em 12 de dezembro de 1901, com a transmissão do Código Morse entre os litorais da Inglaterra e do Canadá. A radiotelegrafia deve este salto ao físico italiano Guglielmo Marconi. Sua descoberta teve utilidade imediata: muitas vidas foram salvas graças ao alerta Save our souls (Salvem nossas almas). O rádio, a televisão, a internet e tudo o que vier a partir de agora devem muito a essas três letras que Marconi propagou através do oceano: S.O.S. E antes disso, no final do século XIX – vejam só – o brasileiro Landell de Moura fizera uma demonstração pública de transmissão da palavra falada, com aparelhos desenvolvidos e patenteados por ele no Brasil e nos Estados Unidos, cobrindo a distância de 8 quilômetros entre a Avenida Paulista e o alto do bairro de Santana.
Queridos ouvintes de Pittsburgh, bom dia!
A Era do Rádio tem início nos Estados Unidos. Com o fim da I Guerra Mundial, a Westinghouse, que fabricava aparelhos para as tropas americanas na Europa, estava com seu pátio totalmente ocupado pelos rádios de comunicação usados nas trincheiras e nos campos de batalha. Para não amargar prejuízo, a empresa instala uma antena e passa a transmitir música para os moradores dos bairros vizinhos da fábrica. A iniciativa alcança sucesso, e os aparelhos encalhados são vendidos à população. O microfone é inventado em 1920, a partir de adaptações no bocal de um telefone. No dia 6 de novembro do mesmo ano, a primeira difusora comercial do mundo, a KDKA de Pittsburgh, no estado da Pennsylvania, anuncia o resultado da eleição presidencial nos EUA.
Cem anos depois do Grito do Ipiranga
Na primeira transmissão radiofônica feita no Brasil, o presidente Epitácio Pessoa discursa no dia 7 de setembro de 1922 para saudar o centenário da Independência, na Exposição Internacional montada na Praia Vermelha, no Rio de Janeiro. O transmissor fora instalado pelos engenheiros da Westinghouse e da Western Electric no alto do Corcovado. O paraibano Epitácio Pessoa, que governou um país sacudido por revoltas sociais e levantes militares, nunca esqueceu este momento de paz.
O rádio nasceu subversivo, mas o governo deu um jeito
O Brasil ganha sua primeira estação de rádio no dia 20 de abril de 1923, com a inauguração da Rádio Sociedade do Rio de Janeiro por Edgard Roquette-Pinto e Henrique Morize. Havia um obstáculo: a lei considerava o rádio um meio de comunicação clandestino. O presidente Artur Bernardes, um nacionalista radical, temia seu uso político. Mas a legislação é revogada pelo então ministro da Viação e Obras Públicas, Francisco Sá, nomeado presidente de honra da emissora graças a uma manobra política de Roquette-Pinto. A Rádio Sociedade seria doada ao Ministério da Educação e Cultura no ano de 1936, quando mudou seu nome para Rádio MEC.
Nas origens do rádio, a oposição deita e rola
A Rádio Clube do Brasil transmite o primeiro comício. No dia 2 de janeiro de 1930, na Esplanada do Castelo, Centro do Rio de Janeiro, o candidato da Aliança Liberal, Getúlio Dornelles Vargas, apresenta sua plataforma eleitoral de oposição ao governo Washington Luiz. Em meio a denúncias de fraude eleitoral, no dia 3 de outubro explodia a Revolução de 1930, que impediu a posse do candidato eleito Júlio Prestes. Em seu lugar, assumiu – adivinhem quem? – o doutor Getúlio, que passou a usar o rádio para se comunicar diretamente com o povo. Mas nem mesmo Getúlio escapou da força do veículo. Em 1932, os paulistas estavam cansados de seu governo e tentaram derrubá-lo. O rádio teve papel importante em mais este “ato subversivo”. Pelas ondas da Record, o locutor César Ladeira conclamou o povo de São Paulo a pegar em armas contra o governo Vargas.
Quando a propaganda se torna a alma do negócio
A publicidade no rádio, até então proibida, é regulamentada em 1932 através do decreto-lei 21.111, assinado pelo presidente Getúlio Vargas. Surge, então, o modelo de radiodifusão comercial que vigora até hoje. E disso se beneficia a música brasileira, porque até então, com o rádio restrito a finalidades educativas e culturais, não havia como inserir os “reclames” (anúncios comerciais) nos intervalos de longos concertos de música clássica ou de óperas. A programação passa a incluir canções populares e esquetes de humor entre os blocos da programação informativa, que era obrigatória. O primeiro comercial é um jingle do compositor Antônio Nássara para uma padaria da Rua Voluntários da Pátria, em Botafogo, veiculado no Programa Ademar Casé, da Rádio Phillips: “Ó padeiro desta rua!/ Tenha sempre na lembrança/ Não me traga outro pão/ Que não seja o Pão Bragança!”.
Surge um fenômeno de comunicação de massa
É inaugurada, em 12 de setembro de 1936, a Rádio Nacional, que se instala no 22º andar do primeiro arranha-céu carioca: o prédio do jornal “A Noite”, na Praça Mauá, nº 7. O dono é o empresário norte-americano Percival Farquhar. A emissora, que seria encampada em 1940 pelo governo federal, dominou os anos dourados do rádio, nas décadas de 1940 e 1950, período em que o rádio se torna efetivamente um meio de comunicação de massa. O pioneirismo da Nacional é incontestável. Em 1936, foi lá que surgiu o primeiro programa de auditório, Caixa de Perguntas, comandado pelo apresentador e cantor Almirante (Henrique Foréis Domingues). Em 5 de junho de 1941, e durante os dois anos seguintes, foi ao ar a primeira radionovela, Em busca da felicidade, de Leandro Blanco, sob o patrocínio do creme dental Colgate. No dia 28 de agosto do mesmo ano, às 12h45min, entra no ar o Repórter Esso, programa que revolucionou o radiojornalismo brasileiro, inicialmente apresentado por Romeu Fernandes, mas que teria em Heron Domingues, a partir de 1944, seu mais famoso locutor.
Aqui fala a Rádio Globo diretamente do Municipal
Eram 21 horas do dia 1º de dezembro de 1944. Depois da execução do Hino Nacional, Gagliano Neto – famoso, entre outras coisas, por ter sido o primeiro locutor brasileiro a transmitir uma Copa do Mundo, em 1938 – foi também o primeiro a ocupar o microfone da Rádio Globo, em seu lançamento oficial. “Aqui fala a Rádio Globo diretamente do Teatro Municipal do Rio de Janeiro, Brasil”. A nova emissora surgiu após a compra da Rádio Transmissora Brasileira, que pertencia à RCA Victor e funcionava na Rua do Mercado, nº 22. Com a venda, este imóvel foi desocupado. O primeiro endereço da Globo foi na Rua Álvaro Alvim, nº 33, que hoje abriga o Teatro Rival-BR. No Municipal o que houve foi a solenidade. O trabalho teve início, de verdade, no dia seguinte, com uma maratona de shows que começou de manhã e só terminou no final da tarde. Já em seu início, o cast da Rádio Globo era composto por nomes que em breve brilhariam nas transmissões da PRE-8. Wolner Camargo, irmão do narrador esportivo Doalcei Bueno de Camargo, foi o primeiro chefe do departamento esportivo, do qual também faziam parte Waldir Amaral, Luiz Mendes e Raul Brunini. O radioteatro, sob o comando de Amaral Gurgel, tinha como uma de suas estrelas a radioatriz Daisy Lúcidi. A sinfônica da Globo era regida por um monstro sagrado da música erudita, o maestro Francisco Mignone.
O primeiro furo de reportagem: Prestes é anistiado
No início de 1945, um dos programas de maior destaque na emissora era oCorrespondente de Guerra, que veiculava o noticiário do conflito diretamente do front italiano, com a leitura dos textos de Egydio Squeff, jornalista enviado pelo Globo para cobrir a participação da Força Expedicionária Brasileira (FEB) nos campos de batalha da II Guerra Mundial. Em abril, quatro meses depois da primeira transmissão, a Rádio Globo dá seu primeiro grande furo de reportagem ao acompanhar o líder comunista Luiz Carlos Prestes, anistiado por Vargas, dez anos depois de ter sido preso. Em outubro do mesmo ano, a deposição de Getúlio Vargas, no mesmo ano, foi outro momento histórico transmitido ao vivo pela emissora com o frenesi jornalístico exigido por seu criador. Nesta cobertura, a emissora cria o slogan “Rádio Globo, uma emissora de O Globo”. E a partir daí, as grandes coberturas jornalísticas ganham um nome: O Globo no Ar. Em 1948, com a mesma marca, a Rádio Globo transmitiu direto da Câmara dos Deputados os debates sobre a cassação dos mandatos dos deputados eleitos pelo Partido Comunista, postos na ilegalidade. A partir dos anos 1960, o noticiário de hora em hora passa a se chamar O Globo no Ar, com a vinheta característica.
As muitas inflexões de uma Copa perdida
A Copa de 1950 foi a segunda transmitida pelo rádio brasileiro. Em 1938, isso se deveu ao pioneirismo da Rádio Clube do Brasil, que enviara para a França o narrador Gagliano Neto. Interrompido pelos anos de guerra, o Mundial voltou a ser disputado, desta vez no Brasil. O favoritismo da seleção brasileira parecia fato consumado. Mas a rede do goleiro Barbosa foi duas vezes balançada pelos uruguaios, que levaram a taça. O segundo gol, marcado por Gigghia, foi recebido com silêncio fúnebre por 173.850 torcedores que pagaram o ingresso no Maracanã. Uma tragédia nacional que Luiz Mendes, o narrador da Rádio Globo, interpretou com um grito de gol, ou melhor, com um anúncio de gol repetido nove vezes, sempre com uma inflexão diferente – espanto, dúvida, consternação, conformismo, tristeza, desânimo.
Surge a televisão e o rádio precisa ser reinventado
No início dos anos 1950, Assis Chateaubriand inaugura a televisão no Brasil. Muitos artistas, narradores, apresentadores e jornalistas migram para o novo veículo. O rádio sofre um baque, pois os recursos oriundos da publicidade acompanham os elencos. As emissoras passam a investir mais na segmentação da programação, abrindo mão de produções caras em favor de programas mais populares. Em 1952, o empresário Victor Costa cria uma organização com seu nome e funda a Rádio Nacional de São Paulo, comprando a antiga Rádio Excelsior. Em 1954, a Rádio Globo extingue sua equipe de radioteatro. As grandes transmissões esportivas são, no entanto, consideradas intocáveis por Roberto Marinho. E a Rádio Globo, ainda uma emissora de porte médio, envia sua equipe para a Copa do Mundo de 1954, disputada na Suíça. Com a eliminação do Brasil, a Globo é a única estação brasileira que transmite a final histórica entre Alemanha e Hungria.
Dia e noite, transmitindo o primeiro sequestro
Um crime marcou época no Rio de Janeiro, em 1957. Não se falava em sequestro, a não ser para lembrar o crime de que fora vítima, nos anos 1930, o filho do herói da aviação Charles Lindbergh. Não se tinha notícia de algo semelhante no Brasil até o dia 7 de novembro de 1957, quando um bandido sequestrou o menino Sérgio Haziot, de 4 anos, no Rio de Janeiro. Os acontecimentos foram irradiados pela Globo a partir das 22h10min do dia seguinte. Os repórteres não pararam e a emissora ficou no ar dia e noite contando detalhes do episódio, transmitindo trechos da gravação das negociações entre o bandido e a mãe do garoto, orientada pelo chefe de polícia Hermes Machado. O menino foi libertado com vida alguns dias depois e a gravação feita pela Rádio Globo serviu como prova para o encaminhamento das investigações.
O auditório e o declínio dos programas de auditório
No ano de 1957, a Rádio Globo inaugura seu primeiro auditório, com 500 lugares, nas dependências do prédio que ainda hoje abriga o jornal O Globo, na Rua Irineu Marinho, nº 35, Cidade Nova. No entanto, a era dos programas de auditório estava chegando ao fim, apesar da grande audiência ainda verificada em programas da própria Globo e das concorrentes Nacional e Mayrink Veiga. No final dos anos 1950, a TV continuava sua trajetória de consolidação. A Rádio Globo foi uma das emissoras pioneiras na produção de programas de variedades, centrados na figura de animadores de estúdio, depois chamados de comunicadores.
Liderança absoluta em todos os horários
O comunicador é um amigo que falava direto ao ouvinte, levando até ele um pouco de notícia, um pouco de entretenimento, as músicas que gostaria de ver tocadas no rádio. Explorado este novo filão, passaram pelo microfone da Globo grandes nomes do rádio como Roberto Figueiredo, Mário Luiz, Paulo Giovanni, Francisco Barbosa, Haroldo de Andrade, Edmo Zarife, Paulo Barbosa, Waldir Vieira, Paulo Lopes e tantos outros. Foi uma aposta certeira: a partir de 1964, a Globo AM do Rio de Janeiro se torna líder de audiência em todos os horários. O fechamento da Rádio Mayrink Veiga e o declínio da Rádio Nacional contribuem para este salto de qualidade. Em 1965, a Rádio Nacional de São Paulo é adquirida por Roberto Marinho. Em 1967, a emissora assume a liderança também em São Paulo. Dez anos depois, em 1977, muda de nome: surge a Rádio Globo de São Paulo.
O locutor chora na última edição do Repórter Esso
O ano de 1968 foi marcado pelo início da fase mais terrível da ditadura militar, com a edição do Ato Institucional nº 5, no dia 13 de dezembro. No dia 31 de dezembro, a voz emocionada do locutor Roberto Figueiredo apresenta pela última vez o Repórter Esso, que desde 1964 passou a ser transmitido pela Globo. Roberto Figueiredo, não contém o choro. O programa, que foi ao ar ininterruptamente por 27 anos – 18 dos quais com a voz de Heron Domingues –, criou uma legião de ouvintes fiéis. Os tempos mudaram e não havia mais interesse do patrocinador. Na televisão, onde tinha o nome de O Seu Repórter Esso, o noticioso seria substituído pelo Jornal Nacional.
A vinheta mais famosa e repetida pelos brasileiros
Num ano triste como foi 1968, surgiu uma vinheta alegre. O diretor nacional de programação do SGR, Mário Luiz, queria criar algo que expressasse a alegria do torcedor quando a seleção brasileira entrasse em campo para disputar as eliminatórias da Copa de 1970, no México. A vinheta sonora “Brasiiiiil!” foi produzida graças à dobradinha competente formada pelo comunicador Edmo Zarife e pelo produtor técnico José Cláudio Barbedo, o Formiga. Desde então, o grito com eco de Zarife tornou-se o bordão oficial dos jogos do Brasil em Copas do Mundo, Olimpíadas e disputas de campeonatos mundiais das várias modalidades esportivas.
O maior e melhor elenco do rádio esportivo
A Copa de 1970 teve um problema técnico sério. Não havia linhas de transmissão no México para atender a quantidade de emissoras interessadas na cobertura. O jeito foi fazer um pool entre as rádio Globo, Nacional e Gaúcha. Foram dois timaços: os onze em campo, comandados por Zagalo, e a equipe formada por Waldir Amaral, Jorge Cury, João Saldanha, Denis Menezes, Washington Rodrigues, entre outros radialistas. No ano seguinte, Jorge Cury e João Saldanha, que eram da Rádio Nacional, foram contratados pela Globo e passaram a trabalhar na equipe de Waldir Amaral. José Carlos Araujo e Luiz Mendes formavam a segunda equipe. Um luxo só. Em 1977, na Rádio Globo de São Paulo, Osmar Santos assume a chefia do departamento de esportes e revoluciona a linguagem das transmissões esportivas. Ligado ao movimento de oposição ao governo militar, Osmar Santos muda o grito de gol, acrescentando mensagens que todos queriam ouvir: “Este grito estava entalado na garganta de um povo sofrido que tem no futebol o direito de expressar suas ideias e emoções!”.
Da década perdida ao novo século
Os anos 1980 ficaram conhecidos como “A década perdida”. Não para a Rádio Globo, que durante toda a década se manteve firme como campeã de popularidade, apesar da forte concorrência das emissoras FM, a partir dos anos 70. O Sistema Globo de Rádio é pioneiro ao investir no novo segmento, criando a Globo FM, a CBN e a 98 FM, que, nos anos 70, se chamava Eldo Pop FM. Com a saída de Waldir Amaral e, um ano depois, de Jorge Cury, José Carlos Araújo, o Garotinho, que estava na Rádio Nacional do Rio de Janeiro, volta para a Globo e assume o posto de narrador titular em dezembro de 1984. Nos anos 90, por breve período, a Globo perde a liderança, mas esta é retomada poucos meses depois A Rádio Globo de São Paulo cresce e lidera com folgas entre as emissoras AM. Na virada do século, as emissoras do Rio e de São Paulo passam a transmitir em rede, que incorpora em 2002 a Rádio Globo de Belo Horizonte. Hoje, além delas, 28 emissoras afiliadas participam da rede da Rádio Globo. O rádio entra na era da internet e hoje a Globo possui ouvintes fiéis nos cinco continentes e seus comunicadores passam a receber mensagens, pedidos de música e sugestões de pautas dos cinco continentes. No dia 12 de dezembro de 2009, durante a festa dos 65 anos da Rádio Globo do Rio de Janeiro, o veterano Luiz Mendes lembra o início desta saga e emociona o Maracanãzinho lotado quando resume este sentimento que é de todos nós: “A Rádio Globo tem o formato do meu coração”.
Rodelão6970 Aqui Tem Informação
Nenhum comentário:
Postar um comentário